07/12/2018
HC n. 224.728/PE - Trancamento do processo penal em face do sócio

O objeto em discussão no habeas corpus em comento diz respeito a inépcia da denúncia por não preencher os requisitos do art. 41 do CPP, em especial por não individualizar a conduta delituosa praticada pelo réu (sócio/administrador da empresa).
Embora a jurisprudência do STJ e do STF sejam no sentido de que o trancamento do processo penal por meio de habeas coprus seja excepcional, no presente caso o Min. Rogério Schietti Cruz, diante da flagrante ilegalidade, entendeu por por trancar o processo penal por violação do art. 41 do CPP.
Segundo o Min. Cruz, "no caso, entendo que a imputação fática encontra-se insuficientemente delineada na denúncia, visto que não é possível identificar, nos termos que dispõe o artigo 41 do Código de Processo Penal, qual a responsabilidade do paciente no fato, vale dizer, qual a conduta ilícita supostamente por ele praticada que teria contribuído para a consecução do resultado danoso".
Isto porque, a descrição fática na denúncia limita-se apenas em dizer que, "durante o período compreendido entre 1º.2.01 e 31.5.01, o paciente, na condição de sócio administrador da empresa XX, teria suprimido ICMS (...), mediante fraude com a inserção de elementos inexatos em seus livros de registro".
Verifica-se que a denúncia não descreve, minimamente, qual a conduta, como teria sido realizada, nem com que meios o réu realizou. Portanto, acertou o Min. Cruz em trancar o processo penal, pois a denúncia que não descreve ou não individualiza a conduta do réu deve ser considerada manifestamente inepta, por impedir o exercício da ampla defesa e do contraditório.
Nesse sentido, explica Morais da Rosa, “o sujeito na democracia deve se defender de fatos precisos. Sem isso o processo não consegue garantir a ampla defesa e o contraditório. A acusação fixa os limites da instrução probatória e da decisão. Daí serem ineptas as denúncias que descrevem longos espaços [ou nenhum] de tempo em que a conduta poderia ter acontecido, ser precisar minimamente datas e, assim, autorizar o contraditório.” (grifo nosso) (ROSA, Alexandre Morais da. Guia compacto do processo penal conforme a teoria dos jogos. 2.ed., ver. e ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014, p.137).
Caso contrário, narrativas vagas e genéricas dificultam e impossibilitam o pleno exercício da mais ampla defesa, ferindo, ainda, o princípio do devido processo legal. Para Giacomolli, “a admissibilidade de imputações genéricas, indeterminadas, obscuras, vagas, sem individualização da conduta de cada imputado representa um retrocesso material e processual à época da culpabilidade objetiva, com ofensa ao devido processo” (GIACOMOLLI, Nereu José. O devido processo penal: abordagem conforme a Constituição Federal e o Pacto de São José da Costa Rica. São Paulo: Atlas, 2014, p. 128)
Portanto, a presente decisão demonstra que o simples fato de ser sócio ou administrador de um empresa não é o suficiente para a responsabilização penal. É imprescindível a demonstração pelo órgão acusador do nexo causal entre a conduta do sócio/administrador e o resultado lesivo. Isto porque, a Constituição Federal veda a responsabilidade penal objetiva.
Fonte: Superior Tribunal de Justiça